Sara Dias é Prof.ª Mestra em Artes da Cena pela UNICAMP e Instrutora de Yoga, atua como educadora social desde 2006 e atualmente desenvolve projetos relacionados ao bem-estar no terceiro setor.
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Sara Dias
Encontrei no Yoga uma nova forma de me relacionar com o trabalho no terceiro setor. Antes dele, essa relação não estava saudável, me consumindo e mais uma vez me adoecendo. Neste processo de autoconhecimento, percebi que sem me fortalecer individualmente, minha contribuição no coletivo ficava prejudicada e estava prestes a me parar.
Como descrito por Shri Suboth Tiwari, CEO e diretor do Instituto de Yoga Kaivalyadhama, em Lonavala, Índia: “O yoga desempenha um papel de regulação física, mental, emocional, social e espiritual [...] ele assegura que falemos de saúde como um todo, em todos os níveis”.
Em uma entrevista concedida à ABY - Associação Brasileira de Yoga, em 2023, o mestre indiano ressaltou que para nós é mais fácil observarmos a saúde física como indicador de bem-estar, mas indagou o que responderíamos caso nos perguntassem “como você está?” e não estivéssemos com dor de cabeça ou no ombro, por exemplo. Provavelmente, diríamos que “estamos bem” mesmo nos sentindo fragilizadas (os) e com frequente vontade de chorar.
O yoga, em seu trabalho de integração dos saberes, oferece uma nova percepção de individualidade. No meu caso, percebi o quanto meus pensamentos e ações não estavam de acordo com minha essência, meus desejos e potencialidades, mas sim, debaixo de várias camadas de desculpas e escolhas equivocadas. Era necessário rever a rota.
Os Yogas Sutras de Patanjali, texto tradicional da filosofia Yoga, apresentam um caminho de oito passos, descritos primeiramente em sânscrito, a serem seguidos pelo praticante de Yoga (yogue), em busca do autoconhecimento e da autorealização.
São eles:
Mas calma, se você achou esse percurso muito complexo, vamos utilizar os ensinamentos de minha mestra yogue, Carla D’arcanchy, para este momento: “A partir de hoje, temos pelo menos 80 anos para nos aperfeiçoar na arte do Yoga, e já estamos no caminho”.
Além de ser uma prática milenar e contar com uma infinidade de escrituras em seu legado literário, o Yoga tem recebido, a seu favor, um crescente investimento de estudos científicos para comprovar seus efeitos benéficos em todas as esferas humanas, principalmente em aspectos ligados à saúde mental.
Uma das pesquisas mais significativas foi realizada pela neurocientista Ph.D. Sara Lazar, da Harvard Medical School, publicada em 2005, em que foi comparado, por meio de imagens de ressonância magnética, áreas do cérebro de 20 praticantes de 60 anos, que meditavam a pelo menos 8 anos, com um grupo-controle sem experiência em Yoga e meditação. Os resultados apontaram um aumento na espessura do córtex pré-frontal, uma área do cérebro relacionada à memória e à atenção, nos participantes que praticavam meditação.
De acordo com Eliza Kozasa, neurocientista brasileira do Instituto do Cérebro do Hospital Israelita Albert Einstein, que contribui com Sara Lazar em várias pesquisas sobre o Yoga, “esses dados podem significar uma vantagem do ponto de vista cognitivo e do envelhecimento [...] e estão relacionados diretamente com a forma que lidamos com as emoções”.
A fim de fundir a tradição do yoga com a ciência, o Instituto de Yoga Kaivalyadhama, citado no início deste texto, possui um Departamento de Investigações Científicas (SRD) integrado à seu espaço físico, com o intuito de investigar o impacto do yoga em vários parâmetros bioquímicos, fisiológicos e psicológicos do corpo, incluindo efeitos perceptíveis do yoga no câncer, doenças crônicas, terapias genéticas e doenças autoimunes. Kaivalyadhama também publica a revista científica trimestral sobre o yoga mais antiga, chamada Yoga Mimansa, reconhecida por seu padrão de qualidade.
Estamos adoecidos. O cenário pós-pandemia evidenciou uma situação preocupante na forma como os agentes de mudança do terceiro setor lidam com sua saúde mental.
Uma pesquisa denominada “O fator invisível: Bem-estar e saúde mental para fortalecer o ecossistema empreendedor de alto impacto na América Latina e Caribe”, de 2023, publicada pelo Bid Lab em parceria com The Wellbeing Project, descobriu que “6 em cada 10 empreendedores de alto impacto na região apresenta sintomas de burnout moderado e 3 em cada 10 apresentam sintomas graves de sofrimento psíquico”.
Relacionado com esses dados, um outro estudo publicado em 2020, pela Phomenta, para saber “Como está a saúde mental dos gestores das ONGs”, revelou que “apesar da maioria dos respondentes possuir grandes preocupações e sintomas físicos característicos de transtornos de ansiedade e de outra natureza, quase metade nunca buscou um profissional para lidar com questões emocionais”.
Dessa forma, há pelo menos duas necessidades latentes a serem revistas no que se trata da saúde mental no terceiro setor: A primeira, diz respeito ao olhar que as ONGs têm para este cenário de adoecimento dos gestores e, consequentemente, de suas equipes, criando espaços e aberturas para discussão e ações intencionais para promover o bem-estar organizacional. E o segundo, na priorização do autocuidado por cada agente de mudança, ao investir em ferramentas que possam fortalecê-lo(a) emocionalmente para lidar com os desafio da causa e da vida.
O yoga pode ser uma alternativa nos dois casos. Ela pode ser uma prática oferecida de forma coletiva para as equipes, com a parceria de um professor ou escola de yoga, e pode ser agregada de forma individual por cada um.
Para Sri Suboth “O yoga é a observação de você mesmo. Você não quer que as outras pessoas fiquem observando as posturas mais difíceis que você pratica, nem você foi feito para observar como os outros fazem posturas tão bem. Você foi feito para observar e estar alerta às coisas que acontecem com você, porque a jornada começa dentro de você. O mundo pode estar bonito, mas se você não estiver estável, não tiver harmonia internamente, nada vai parecer bonito. E o mundo lá fora pode nem estar tão bonito, mas enquanto você estiver bem internamente, satisfeito, tiver compaixão, amor, afeição, o mundo vai parecer bonito”.
Marcos Aquino, vice-presidente da ABY, corrobora dizendo que “se o yoga for praticado de forma adequada, ou seja, para dentro, esta pessoa que o pratica é potencialmente mais sensível. Potencialmente com capacidade de responder às situações desse mundo de uma forma diferente, mais positiva. Pode ser uma pessoa mais agradável”.
Precisamos nos fortalecer, precisamos fortalecer nossos pares. Se não for o yoga, encontre outra maneira de rever suas prioridades, se auto observar, de renovar suas energias. Faremos muito mais diferença neste mundo se começarmos dentro de nós.
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Referências:
. Bid Lab e The Wellbeing Project: Pesquisa “El factor invisible - Bienestar y salud mental para fortalecer el ecosistema emprendedor de alto impacto en América Latina y el Caribe”. 2023. Disponível em: https://wellbeing-project.org/el-factor-invisible/
. Entrevista ABY - Sri Suboh Tiwari: “Dia Internacional do Yoga”. Disponível em:
https://aby.org.br/dia-internacional-do-yoga-2/
. Instituto de Yoga Kaivalyadhama: Disponível em:
https://kdham.com/about-kaivalyadhama/
. Lazar, S. W., Kerr, C. E., Wasserman, R. H., Gray, J. R., Greve, D. N., Treadway, M. T. et al. (2005). Meditation experience is associated with increased cortical thickness. neuroreport, 16(17), 1893-1897. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1361002/
. Patanjali. Os Yoga Sutras de Patanjali: Texto clássico fundamental do sistema filosófico do Yoga, Volume 1.Editora Mantra: 2017. Carlos Eduardo Gonzales Barbosa (Tradutor).
. Phomenta. Pesquisa “Como está a saúde mental dos gestores das ONGs?”. 2020. Disponível em:
https://www.phomenta.com.br/saude-mental-gestores-ongs
Sara Dias é Prof.ª Mestra em Artes da Cena pela UNICAMP e Instrutora de Yoga, atua como educadora social desde 2006 e atualmente desenvolve projetos relacionados ao bem-estar no terceiro setor.
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